As águas saem
do oceano e chegam até as nuvens sob a forma de vapor, depois caem na terra sob
a forma de chuva ou neve. Ao chegar no terreno, uma parte fica em cima da terra
formando rios, lagos, geleiras e neves, e outra penetra na terra e fica lá por
muito tempo. Em ambos os casos, as águas caminham até voltarem ao oceano e
fecharem o ciclo das águas, que é denominado Ciclo hidrológico (Figura 1). As
águas que ficam em cima da terra são as águas superficiais e as que ficam
debaixo da terra preenchendo seus vazios são denominadas águas subterrâneas.
No nosso planeta, os
estoques de água subterrânea são estimados em 8,4 milhões de km³, cerca de 67
vezes o volume total de água doce líquida de superfície, representando ainda
97% do volume de água doce líquida do planeta, segundo a Associação Brasileira
de Águas Subterrâneas-ABAS Núcleo Ceará (2007).
Na prática
podemos listar os usos múltiplos da água, como abastecimento humano,
dessedentação animal, abastecimento industrial, agricultura, geração de
energia, lazer e demandas ecológicas. Mas apenas citar não exaure a discussão,
uma vez que o foco que procuramos dar é a relação de dependência do homem com a
água enquanto bem universal, econômico, ambiental e público, que serve a todos.
É
inquestionável a utilidade que a água representa para o homem e a sua presença
é fator determinante para a melhoria do bem-estar e o desenvolvimento das
comunidades urbanas e rurais. Por essa razão e outras tantas, convém declarar
nossa intenção de invadir um pouco a área do conhecimento jurídico, com o
objetivo de, à luz da legislação brasileira, apresentar uma abordagem daquilo
que julgamos tão importante na gestão do recurso hídrico, como tão somente reconhecer seu
uso mas também sua direta utilização pelo homem.
Já deve ser de
conhecimento seu, meu caro leitor, que o meio ambiente devidamente equilibrado
é um direito de “todos”, de acordo com o artigo 225 da Constituição Federal de
1988. Trilhando esse caminho, nossa casa legislativa publicou a Lei da Política
Nacional de Recursos Hídricos (Lei Nº 9.433) em 1997, que instituiu o Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e passou a tratar a água como
bem de domínio público, no sentido de bem de uso comum do povo. Esta lei
federal veio para regulamentar o Inciso XIX, do Artigo 21, da Constituição
Federal de 1988.
Importante
ressaltar que antes mesmo dessa lei federal de 1997, alguns Estados brasileiros
já haviam se antecipado e elaborado suas leis sobre o tema como São Paulo – Lei
7.663/1991; Minas Gerais – Lei 11.504/1994; Bahia – Lei 6.855/1995; Ceará – Lei
11.996/1992 e o Rio Grande do Norte que publicou a Lei 6.908/1996.
Segundo o
artigo 20 da Constituição Federal de 1988, são bens da união, entre outros
(...) III- lagos, rios quaisquer correntes de água em terrenos de seu (união)
domínio. Por essa razão, os recursos hídricos constituem recurso ambiental e se
submetem à aplicação de instrumentos econômicos para que seu uso e
aproveitamento se dê em prol de toda coletividade. Ao definir valor econômico
ao bem natural, promove-se a racionalização do seu uso e evita-se desperdício.
Diga-se de
passagem, por essa razão é que o Estado deve consentir a utilização da água
como recurso hídrico, utilizando para isso um instrumento denominado de Outorga
de direito do uso, um importante instrumento de gestão ambiental. Reitero, a
outorga é um simples direito para o uso, e não uma alienação do bem pelo Estado para um usuário qualquer.
Até aqui já podemos buscar um link com o desenvolvimento sustentável. Só porque a água é
bem protegido pela constituição ela deve ficar disponível às futuras gerações?
A resposta é sim. Porém, devemos acrescentar que não somente a disponibilidade,
como também a utilização racional e a utilização integrada, previstos na Lei
9.433/1997. Para o emérito professor e
jurista Paulo Afonso Leme de Machado (2014), a ética da sustentabilidade das
águas ganhou respaldo legal e não deve ser deixada como enfeite na legislação,
podendo por isso ser invocado o poder judiciário quando necessário. Para a
Câmara Temática de Águas, do CEBDS (2015), a água é o eixo temático da
sustentabilidade.
Em 2015, segundo
a revista exame (edição 1083) o Brasil estava desidratado. O risco de
racionamento, que variou de 50 a 90% nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e
Belo Horizonte, colocou o país também em risco uma vez que as três metrópoles
juntas representavam 30% de participação no PIB Brasileiro (R$ 1,5 trilhão) e
afetavam 39 milhões de pessoas (20% da população brasileira), podendo ainda trazer
consequências ao emprego de mais de 13 milhões de brasileiros (27% da força de
trabalho). Importante lembrar que um o risco de racionamento de água anda de
mãos dadas com a falta de energia elétrica, uma vez que a matriz energética
brasileira tem origem nas hidrelétricas.
Você sabia que
a água além de um bem essencial à vida, faz parte de tudo que consumimos? Quem
poderia pensar que são necessários 15.000 L de água para gerar 1kg de carne
bovina. E 11.000 L de água par confeccionar 1 calça jeans, além de mais 21 L
para cada lavagem, segundo pesquisa econômica da GO Associados (2015). Talvez
por essa razão é que Ricardo Zibas, Diretor de sustentabilidade da consultoria
KPMG, ressalta que a ideia de que o Brasil tem água abundante e barata, possa
ter ofuscado a gestão racional desse recurso hídrico. Estamos diante, porque
não, de pensar no cálculo da pegada hídrica, assim como foi tão bem difundido o
conceito da pegada ecológica na última década.
As projeções
indicam aumento no consumo, para beber, para uso industrial, para alimentos,
agropecuária, além de outros setores. Agora que estamos chegando ao fim da
leitura, talvez você leitor já deve ter concluído que isso afetará grandemente
os recursos hídricos ambientais, certo? E se isso ocorre voltamos ao início do
ciclo, que não é hidrológico, mas o ciclo econômico que depende dos recursos
naturais como matriz de toda a base econômica.
Podemos ver no
mapa a seguir um pouco desse cenário e ficar antenado o quanto ele preocupa o
Estado e a sociedade Brasileira. (Figura 2 – Situação das bacias hidrográficas
brasileiras, 2013).
Para a ONU,
devemos buscar uma forma de obter segurança hídrica. Mas, o que vem a ser
segurança hídrica. A organização internacional definiu como sendo “A capacidade
de uma população para garantir o acesso sustentável a quantidades adequadas de
água, com qualidade aceitável para a subsistência, o bem-estar humano e o
desenvolvimento socioeconômico, assegurando a proteção dos recursos hídricos
contra a poluição e os desastres relacionados com a água, bem como a
preservação dos ecossistemas em um clima de paz e estabilidade política” (UN-Water,
2013).
Por essa e
outras razões é importante chamar atenção para a condição indissociável da
gestão do recurso hídrico na empresa com a gestão ambiental. Não basta apenas
comentar do ciclo hidrológico e de suas conexões. Os desafios são mais
complexos, modernos e contundentes quanto ao desenvolvimento econômico,
ambiental e social.